Abusos sexuais, o drama das meninas cambojanas

As violações costumam ocorrer em zonas rurais remotas

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Os abusos sexuais, particularmente em adolescentes, são um crime impune e um drama que se repete quase diariamente no Camboja, segundo denúncias que coincidem com a celebração hoje do Dia Internacional da Mulher.

Uma adolescente de 12 anos, que no dia anterior voltou a ser violada pela terceira vez por seu padrasto, acaba de entrar no centro de ajuda de Banteay Srei, acompanhada de sua mãe, que decidiu denunciar o marido porque o considera "uma má pessoa".

A menina entra em pânico toda vez que um homem passa em frente à porta do centro ao receber atendimento médico. Enquanto isso, sua mãe ouve os procedimentos legais para levar o crime à Justiça.

"Temos entre oito e dez casos por mês", afirma Sun Maly, coordenadora de Banteay Srei (Fortaleza da Mulher) de Battambang, província do noroeste do Camboja onde mais se registram agressões às mulheres.

"As violações costumam ocorrer em zonas rurais remotas. Ali, as casas não têm privacidade, todo mundo dorme junto", ressalta Maly.

A especialista acrescenta que quase todas as vítimas são meninas de 13 anos em média, porque esta é uma idade em que podem ficar sozinhas cuidando da casa enquanto suas mães trabalham fora, algumas inclusive passam toda a semana na Tailândia.

Ao longo do ano passado, Banteay Srei acolheu 71 mulheres. Neste ano, somente em janeiro, registrou 11 casos.

"Um menor nunca se atreverá a discutir ou contradizer um adulto.

Se alguém diz a uma menina que vá com um adulto, ela não tentará recusar, por mais medo que sinta", explica Maly.

Dois recentes relatórios denunciam o auge das violações no Camboja e narram que os agressores frequentes são pais, padrastos, cunhados, tios, primos, meio-irmãos ou vizinhos.

A organização End Child Prostitution, Abuse and Trafficking (ECPAT), que combate a prostituição infantil, tem dados de 332 casos e 337 vítimas, das quais 204 são menores de idade, em 2009, 16,7% mais que no ano anterior.

A organização cambojana de direitos humanos Adhoc contabilizou 460 incidentes, dos quais 75% referentes a menores de idade.

Segundo a ministra cambojana de Assuntos da Mulher, Ing Kantha Phavi, o problema está no aumento do consumo do álcool e na pornografia.

Os tribunais do país não têm o costume de processar esse tipo de agressão. Isso porque as mulheres não podem bancar os custos do processo, porque o agressor ameaça as vítimas ou porque as partes chegam a um acordo de indenização ou por causa da corrupção generalizada.

"A cultura da impunidade faz com que os agressores não tenham medo de cometer violações sexuais", assegura o estudo da Adhoc.

Segundo a organização, apenas 1% dos violadores acaba atrás das grades no Camboja.

A Anistia Internacional também condena a falta de proteção das mulheres violadas no Camboja por causa corrupção da Polícia e dos tribunais, enquanto seus agressores saem impunes, embora a lei preveja penas de até 20 anos de prisão para este crime.

Há dois meses, um guarda abusou de uma adolescente em um karaokê de Phnom Penh. Mas tudo o que ele recebeu de punição foi uma "advertência administrativa" pois, conforme explicaram as forças de segurança, o caso "não pode ser considerado abuso sexual porque a vítima não era virgem".

Além da agressão e do pânico de conviver com seus agressores, as vítimas ainda têm que tolerar o peso do estigma social.

"Um pai não deixou seus filhos brincarem com uma menina que tinha sido violada", conta Maly, sobre as humilhações que sofrem as vítimas.

No Camboja, as jovens abusadas e as prostitutas são tratadas pelo mesmo apelido social: "mulher vulgar".

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