Pela terceira vez em seis anos, o fazendeiro Vitalmiro Bastos de Moura, o "Bida", foi condenado por ser o mandante da morte da missionária americana Dorothy Stang, em 2005. O julgamento ocorreu nesta quinta-feira (19), em Belém.
Na noite desta quinta, os jurados da Segunda Vara do Júri de Belém se reuniram e entenderam que ele encomendou o crime. A sentença do juiz Raimundo Moisés Alves Flexa determinou pena de 30 anos de prisão, semelhante ao do último julgamento, em 2010.
O magistrado alegou. "Ela foi morta por conflitos fundiários, covardemente abatida, sem concorrer para o crime. Era uma pessoa de clara generosidade com o seu semelhante. A pena deve ser servir de exemplo", afirmou.
Conforme a denúncia, Bida foi condenado por homicídio duplamente qualificado, por encomenda mediante promessa de recompensa e morte por meio que dificultou a defesa da vítima. Foi o quarto julgamento de Bida pelo crime, com três condenações.
Segundo o MPE (Ministério Público Estadual) do Pará, apesar da condenação, o fazendeiro seguirá detido em regime semiaberto (quando o sujeito tem liberdade, mas precisa dormir na cadeia).
O novo julgamento do fazendeiro ocorreu por decisão do STF (Supremo Tribunal Federal), em maio deste ano, que anulou o terceiro júri popular do fazendeiro, quando foi condenado a 30 anos de prisão. Nos dois anteriores, ele foi condenado e inocentado.
Durante o júri foram ouvidas oito testemunhas, três de acusação e cinco de defesa.
O delegado da Policial Civil paraense, Waldir Freire Cardoso, falou sobre o inquérito que presidiu e voltou a explicar que as investigações apontaram para a morte da missionária a pedido do fazendeiro.
O MPE defendeu a tese, perante os jurados, de que Bida ofereceu R$ 50 mil aos executores de Dorothy porque tinha interesse na morte da missionário. O fazendeiro teria terras griladas no sudoeste paraense e seria um dos alvos dos protestos da americana.
Durante a acusação, o promotor Edson Cardoso acusou o fazendeiro de pagar R$ 10 mil para que os executores do crime mudassem o depoimento e inocentassem Bida na fase judicial do inquérito.
Durante depoimento de defesa, Raifran das Neves Sales e Amair Feijoli da Cunha --ambos condenados e cumprindo pena pelo homicídio-- negaram a participação de Bida. Cunha alegou que sofreu pressão inicial para acusar o fazendeiro.
O acusado negou a versão do MPE e, durante seu depoimento, alegou que estava em Anapu. Ele disse que, após o crime, os dois condenados por autoria material foram à sua fazenda e confessaram o crime, mas alegou que não encomendou o crime.
Por parte da defesa, a novidade do quarto novo júri foi uma testemunha arrolada pela defesa, o ex-policial federal Luiz Fernando Raiol, que inocentou o fazendeiro do crime. Ele alegou que fez segurança de Dorothy e que investigou o caso, e não encontrou provas contra o fazendeiro.
A família de Dorothy e integrantes da congregação Irmãs de Notre Dame Namur, à qual pertencia a missionária, negaram que Raiol foi segurança de Dorothy, e alegaram que ele não tinha proximidade com ela. A alegação foi feita por Rebeca Spires, que prestou depoimento à Justiça nesta quinta-feira.
Durante a fase de debates, o advogado Arnaldo Lopes questionou a investigação policial e disse que Bida foi feito de "bode expiatório" para "dar uma resposta e mostrar que o Pará faz Justiça".
"Não existe motivação caracterizada de Vitalmiro tinha na morte de Dorothy. Ele não tinha interesse, e não há provas. Tudo é para mostrar o que não é verdade", disse.
Movimentação
Na porta do fórum, muitos integrantes de entidades sociais e religiosas fizeram vigília. Os 170 lugares do plenário não foram suficientes. Boa parte dos espectadores era dos municípios de Anapu e Pacajá, no sudeste do Pará. Também acompanharam o julgamento irmãs de "Notre Dame".
Integrantes da CPT (Comissão Pastoral da Terra) também realizaram movimentação desde o começo do dia, com realização de culto ecumênico e orações. Entidades internacionais também acompanharam o júri na capital paraense.
Histórico
Dorothy realizava trabalho social na região de Anapu, sudoeste do Pará, para implantação do Projeto de Desenvolvimento Sustentável. Ela foi morta em 12 de fevereiro de 2005. À época com 73 anos, ela levou seis tiros após ser abordada em uma estrada de terra de difícil acesso do município.
O julgamento desta quinta-feira foi o oitavo de pessoas acusadas de envolvimento no crime. O primeiro deles aconteceu em dezembro de 2005, quando Raifran foi condenado a 27 anos de prisão, e Clodoaldo Carlos Batista, a 17 anos.
No segundo júri do caso, realizado em abril de 2006, foi a vez de ser condenado o réu Amair Feijoli da Cunha, a 18 anos de reclusão.
Os julgamentos de Bida começaram em seguida. O primeiro deles foi realizado em maio de 2007, quando ele foi condenado a 29 anos de reclusão.
O quarto júri veio após a defesa de Raifran conseguir anular a primeira decisão. O novo julgamento foi realizado em outubro de 2007, quando ele foi condenado novamente a 27 anos de reclusão.
O quinto julgamento do caso ocorreu em maio de 2009, quando se sentaram no banco de réus o fazendeiro Bida e novamente Raifran Sales. O fazendeiro acabou absolvido, e Raifran, condenado a 28 anos de cadeia.
Como o MPE recorreu, um novo júri do fazendeiro foi realizado em abril de 2010, com a nomeação de um defensor público para fazer a defesa do réu. Bida foi novamente condenado à pena de reclusão de 30 anos.
Além de Bida, também responde como mandante do crime o pecuarista Regivaldo Pereira Galvão. Ele é acusado de prometer recompensa para quem matasse a missionária. Conhecido como "Taradão", ele foi condenado a 30 anos de prisão em outubro de 2011, mas recorre da decisão para tentar anular o júri.