Cinquenta e três fotografias resumem a versão contada por Elize Araújo Kitano Matsunaga aos policiais sobre como ela matou o empresário e ex-diretor executivo da Yoki Marcos Kitano Matsunaga. As imagens fazem parte do laudo da reprodução simulada, mais conhecida como reconstituição do crime. O documento, concluído na quinta-feira (16), foi entregue ao departamento que investiga o caso e será enviado ao Ministério Público (MP).
No final de maio, Marcos Matsunaga, executivo da empresa de alimentos Yoki, foi assassinado. Dias depois, sua mulher, Elize, confessou o crime à polícia.
A bacharel em direito está presa pelo crime. Ela foi denunciada pelo MP e aguarda a audiência de instrução na Justiça, na qual ficará definido se ela irá a júri popular. O laudo será anexado ao processo.
O laudo da reprodução será confrontado, durante um eventual julgamento, com as demais provas. Ele não será a única fonte de informação para juiz e jurados. Advogados e a promotoria também usarão testemunhos e outro parecer produzidos pela polícia durante a investigação. O principal é olaudo do Instituto Médico-Legal (IML), divulgado em 16 de junho, que aponta que Marcos morreu asfixiado e foi decapitado ainda vivo.
No documento, os peritos afirmam que, segundo a versão de Elize, o tiro que atingiu Marcos ocorreu a 1,94 m de distância. O laudo afirma que essa distância é plausível. A reconstituição do assassinato ocorreu no apartamento do casal, na Zona Oeste de São Paulo, onde ele foi morto.
Ainda de acordo com o documento, exames técnicos e de DNA comprovaram que o sangue encontrado no apartamento é mesmo da vitima. A distância do tiro e o momento da morte de Marcos são pontos divergentes em relação ao lado do Instituto Médico Legal (IML) que examinou o corpo do empresário.
O documento de 78 páginas será encaminhado na sequência ao Ministério Público para ser anexado ao processo que apura o crime. Ré confessa, ela aguarda presa a data da audiência de instrução na Justiça para saber se irá ser submetida a júri popular pelo homicídio.
A reprodução simulada foi feita por peritos do Núcleo de Perícias em Crimes contra a Pessoa do Instituto de Criminalística (IC) da Polícia Técnico-Científica em 6 de junho, baseada na versão apresentada por Elize. Ela mesma participou dos trabalhos dos peritos.
As fotos mostram a mulher indicando como usou uma pistola, calibre .380, para atingir Marcos, e depois pegou uma faca de cozinha para esquartejá-lo e colocar os pedaços em três malas de viagem.
O laudo, que está dividido em três partes (descrição do local; reprodução simulada; e dos exames) com um anexo (desenho esquemático da cena do crime), trata somente do momento em que o casal discutiu em 19 de maio, quando a bacharel revelou ao empresário que descobriu a traição dele, até o dia 20, instante em que ela deixa o apartamento triplex com as malas onde estavam as partes do corpo da vítima. Na reprodução, um policial interpretou Marcos.
Reconstituição
No capítulo sobre o local do crime, 31 páginas descrevem cada cômodo da residência. As 26 páginas da reprodução simulada mostram por meio de imagens fotográficas feitas com a participação de Elize e de um policial como foi o crime.
A primeira foto retrata a bacharel comendo pizza ao lado do empresário na mesa da sala de jantar. Nas demais, Elize conta a Marcos que soube que contratou um detetive particular que descobriu que o marido a traía com uma garota de programa. Em seguida, relata que ele, ?enraivecido?, se levanta, bate com as mãos na mesa e grita que o dinheiro usado para pagar o profissional que o seguiu era dele.
Ainda nas imagens, a mulher diz que retrucou e o empresário a agrediu fisicamente lhe dando um tapa na cara. Elize falou que nunca havia apanhado do marido e nem do próprio pai. Então, ela saiu do local e vai até o bar enquanto Marcos continua gritando na sala de jantar.
No bar, Elize vai até uma cômoda atrás do balcão, onde havia uma pistola. Na casa, havia 33 armas que o casal mantinha. Segundo ela, com medo de assaltos. Nas fotos da perícia, Elize usa um simulacro de arma. Ela, então, pega a pistola e vai até a copa enquanto o marido permanece gritando na sala de jantar. Depois, a mulher percebe ele indo em sua direção num corredor entre a sala de jantar e a copa.
Quando ficam frente a frente, Elize está com a arma na mão e Marcos, na versão apresentada pela viúva, a desafia a disparar, dizendo que ela não tem coragem de atirar nele. Nesse momento, ela disse que o marido falava com ?ódio e raiva nos olhos? que iria se separar dela, interná-la e ficar com a filha do casal. Foi a partir desse instante que a bacharel atirou sem mirar.
Divergência na distância
Em seguida, afirma que viu Marcos cair de costas, ficando com a barriga para cima no corredor. Medição feita pelos peritos indica que a distância entre a boca do cano da arma e o empresário é de 1,94m.
Essa medição, no entanto, diverge de uma informação que não consta neste laudo, mas já havia sido dita pelo perito do Instituto Médico-Legal (IML), que examinou o corpo da vítima, de que o tiro havia sido dado a curta distância e de cima para baixo. A conclusão havia sido do legista Jorge Pereira de Oliveira, que, no seu entendimento informou que Elize estaria em pé e Marcos abaixado. O tiro teria sido à queiama-roupa, segundo análise dos peritos, que constataram queimadura nas margens do ferimento.
As fotos do laudo mostram Elize caminhar entre a copa, cozinha e a sala de jantar. Depois ela vai ao bar, passando perto do marido, que segundo ela já estava morto. Essa informação também diverge da propagada pelo IML, de que Marcos ainda continuava vivo após ter sido baleado na cabeça e que morreu asfixiado quando teve o pescoço cortado com uma faca por Elize.Para o IML, a vítima morreu por traumatismo craniano, causado por bala, e asfixia respiratória provocada por sangue aspirado devido à decapitação.
Ainda sobre o laudo, ela conta que deixou a arma usada para atirar em Marcos no corredor e foi até o bar. Depois, pegou o telefone para ligar para a Polícia Militar para relatar o que havia ocorrido, mas desistiu. Ela diz que pegou a arma novamente e foi até o escritório do casal, deslocando um espelho embutido na sala de armas. Lá, ela pega um cano sobressalente e o troca com o que havia sido usado na pistola do crime. Ela, então, guarda a arma numa caixa e vai até a lavanderia.
Em seguida, Elize diz que pegou pano, produtos de limpeza e um balde para limpar o piso onde havia marcas de sangue do marido. Ela também resolve guardar o corpo, arrastando-o. Marcos pesava pouco mais de 70 quilos. Durante o trajeto, a mulher para algumas vezes para descansar. Em seguida, deixa o empresário no quarto de hóspedes.
No dia seguinte, ela retorna ao quarto com o intuito de segmentar o corpo do empresário após a chegada da babá. Enquanto a funcionária fica brincando com a filha do casal em um andar, ela pega uma faca de começa a cortar o corpo, primeiramente pelos joelhos, depois membros superiores esquerdo e direito, abdômen e, por fim, o pescoço.
Ela coloca as partes dentro de sacos plásticos e as divide em três malas. Depois começa a limpar o quarto de hóspedes. Posteriormente, leva as malas pelo corredor, lavanderia e vai até o elevador de serviço do apartamento. Desce até o estacionamento e as coloca no carro.
O que não é simulado no laudo é o momento em que Elize pega o carro e começa a jogar partes do corpo de Marcos em Cotia, na Grande São Paulo.
Não foi possível localizar o promotor José Carlos Cosenzo nesta terça-feira (21) para comentar a conclusão do laudo da reconstituição. Para o Ministério Público, responsável por denunciar a mulher à Justiça pelo assassinato, a versão da ré de que ela só atirou no marido após ter sido agredida fisicamente e verbalmente não se sustenta. Em entrevistas anteriores o promotor havia dito que a bacharel matou o empresário para poder ficar com o dinheiro dele.
A equipe de reportagem também não encontrou o advogado Luciano Santoro, que defende Elize, para falar sobre o documento da reprodução simulada.