Andar pelas imediações do Albertão e não ver um “noiado” é uma tarefa difícil. Pessoas com problema de drogadição estão se espalhando pelas ruas da zona Sul de Teresina, como uma epidemia incurável, provocada por pedras de crack. A população vive sobressaltada, pois quem morre na guerra do tráfico são os filhos das comunidades carentes.
Os drogadicentes, alheios à equipe de reportagem, balbuciam ódio e horror em verdadeiras viagens a pé, por todo o percurso das avenidas Gil Martins, Miguel Rosa e imediações do Hospital de Urgências de Teresina (HUT).
A cena triste se repete todos os dias, quando humanos se acumulam em colchões pelas ruas, vulneráveis a tudo o que há de pior na sociedade.
A crackolândia de Teresina – tradicionalmente localizada atrás do estádio de futebol – não é mais apenas aquele espaço, que hoje se transforma em um verdadeiro lixão ocupado por inebriados. A crackolândia invadiu as ruas da capital, e mostra que o problema da droga não será sanado apenas com repressão policial.
O que é perceptível todos os dias nas ruas de Teresina também é observado nos números apresentados em nível nacional. Basta lembrar que segundo o Levantamento Nacional de Álcool e Drogas (LENAD), quase 6 milhões de brasileiros (equivale a 4% da população adulta) já experimentaram derivados da cocaína, o que também inclui o crack.
No caso da cocaína fumada (crack, merla e oxi), 2 milhões de brasileiros confirmam já ter experimentado (1,4% dos adultos e 1% dos jovens do Brasil).
No caso da maconha, que tem seu uso em discussão no legislativo sob proposição do deputado Jean Wyllys (PSOL- RJ), o número é ainda maior: 7% da população adulta já experimentou a cannabis. Quanto ao uso constante, 3 milhões de pessoas declararam ser usuárias do entorpecente.
Os adolescentes também configuram os números apresentados pelo LENAD quanto ao uso da erva, o que mostra que quase 600 mil adolescentes (4% da população) já usou maconha pelo menos uma vez na vida, enquanto a taxa de uso no último ano foi idêntica a dos adultos (3% equivalente a mais de 470 mil adolescentes).
Além disso, mais da metade dos usuários, tanto adultos quanto adolescentes, consome maconha diariamente (1,5 milhão de pessoas).
Tratamento não deve ser compulsório
Segundo Sâmio Falcão, coordenador estadual de enfrentamento às drogas, o Governo do Estado do Piauí trabalha com a recuperação de dependentes químicos. "Quanto ao acolhimento, nós não fazemos internação compulsória.
As pessoas devem, voluntariamente, fazer o tratamento em comunidades terapêuticas. A recuperação e a reinserção social acontecem assim", afirma.
Para ele, a solução encontrada pela Coordenadoria Estadual de Enfrentamento às Drogas (CEDrogas) são as internações.
"Queremos ofertar as internações financiadas pelo Governo Federal e do Estado para fazer esse tipo de tratamento. É um serviço gratuito", reitera.
E com o objetivo de elucidar a população sobre esta problemática, a CEDrogas está com uma programação entre os dias 22 e 26 de junho. O objetivo é levar à sociedade a discussão sobre o trabalho de prevenção às drogas em seus mais diferentes aspectos.
A expectativa é que o evento seja um primeiro passo para o amadurecimento da discussão sobre as questões que envolvem os males oriundos do consumo de drogas.
Redução de danos é alternativa
Em oposição ao enfrentamento, a figura do redutor de danos tem aparecido como uma alternativa real para a conscientização quanto aos usos e riscos de substâncias psicoativas.
"A redução de danos é uma estratégia de saúde pública, assegurada pela Constituição Federal desde 1988, apesar de ser muito negligenciada no Brasil. Ela busca minimizar os danos causados por substâncias psicoativas", explica Jaime Neto, redutor de danos.
Jaime aponta a redução de danos como uma alternativa às estratégias tradicionais. "Em Teresina a redução de danos é muito necessária. A cidade está tomada pela droga nas periferias e nos guetos. A estratégia comum, aplicada hoje em dia, é um fracasso total, como podemos observar", complementa o profissional.
A redução de danos é multidisciplinar, geralmente vinculada à área da psicologia. "Ela funciona através do vínculo criado entre o redutor de danos e o usuário, e este vínculo acontece no local do uso da droga. É uma profissão de risco. Através desse vínculo é construída a estratégia, através do autocuidado", finaliza Jaime.