A procuradora de Justiça aposentada Vera Lúcia Sant"Anna Gomes, de 57 anos, está sendo considerada foragida da justiça por não ter sido encontrada após o mandado de prisão preventiva efetuado na tarde dessa quarta-feira. No fim da tarde, policiais estiveram em dois endereços da procuradora - um apartamento em Ipanema e uma casa em Búzios -, mas não conseguiram encontrá-la. O juiz da 32ª Vara Criminal, Guilherme Schilling Pollo Duarte, decretou a prisão preventiva da procuradora de Justiça aposentada , acusada de agredir a filha adotiva T., de 2 anos e 10 meses. Ela havia sido denunciada pelo crime de tortura pelo Ministério Público.
A ordem de prisão foi expedida após várias idas e vindas nos tribunais. Na noite de terça-feira, o juiz Roberto Câmara Lacé Brandão, em exercício na 32ª Vara Criminal, entendeu que o caso deveria ser encaminhado para o 1º Juizado Especial de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher. Ele alegou que Vera Lúcia deveria ser submetida à Lei Maria da Penha. Isso porque a menina havia sido agredida na casa da servidora. Porém, na tarde de ontem, a promotora Márcia Colonese entrou com pedido de revisão da decisão para o juiz Guilherme Schilling Pollo Duarte, titular da vara.
Em nova decisão, Duarte alegou que, pelo fato de a vítima ser criança, a competência não caberia ao 1º Juizado Especial de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher. "Embora os fatos tenham sido praticados no contexto de uma relação familiar, as agressões teriam ocorrido não por ser a vítima uma mulher, mas por ser uma criança. Nesse contexto, a acusada praticou os fatos não em função de uma dependência econômica, social, ou tão-somente física da vítima, ou mesmo em razão de gênero, mas sim por ser a vítima menor impúbere", afirmou ele, em sua decisão.
O juiz entendeu ainda que há indícios na denúncia de que Vera Lúcia cometeu o crime - o que justifica a prisão. Segundo Duarte, a liberdade da procuradora aposentada põe em risco a garantia da ordem pública e a busca por provas, já que ela teria intimidado testemunhas.
Embora a polícia não tenha encontrado Vera Lúcia em casa, o advogado dela, Jair Leite Pereira, informou que a procuradora estava no local, proibida de falar com qualquer pessoa. "Vou orientá-la a se apresentar à Justiça, o melhor caminho, ou entrar com habeas corpus para tentar anular a prisão", disse.
Em 27 dias sob a tutela de Vera Lúcia, a filha adotiva foi submetida, segundo denúncia do Ministério Público (MP), a sessões diárias de violência. Ela ficava trancada em um quarto. "Neste calvário a que a pequena criança foi submetida, incluía-se toda sorte de perversidade", diz o documento enviado à Justiça.
Os promotores demonstram preocupação com a capacidade visual da criança. Foi constatado no Hospital Miguel Couto, Gávea, onde o Conselho Tutelar a socorreu, hematomas nos olhos. Os ex-funcionários, que denunciaram o caso, serão ouvidos novamente para saber se há crime de racismo, já que eles alegaram ter sido ofendidos por Vera.
MP entra com pedido de indenização de R$ 510 mil
Pagamento de indenização de mil salários mínimos, o equivalente a R$ 510 mil, custeio de tratamento psicológico e pensão mensal até T. completar 18 anos. Esses foram os pedidos feitos pelo Ministério Público (MP) em ação civil pública contra a procuradora Vera Lúcia de Sant"Anna Gomes, encaminhada ontem à Vara de Família, Infância, Juventude e Idoso da Capital.
Para o MP, é preciso ainda que T. seja submetida a estudo psicológico para verificar o dano emocional causado pelas agressões da procuradora aposentada. Na ação, foi ressaltado que Vera Lúcia sabia do histórico de sofrimento pelo qual a menina já havia passado e, ainda assim, violou sua integridade física. "A ré, ao pleitear a adoção da criança e, antes mesmo de obter a guarda provisória, tinha plena ciência de sua história de abandono. E, apesar disto, na qualidade de guardiã provisória da menor, ao invés de proporcionar-lhe amor e a segurança que esta jamais teve, colocou-a em risco mais um vez".
A revelação das agressões de Vera Lúcia à T. foram feitas por ex-funcionários da procuradora aposentada, indignados com as sessões de tortura. Os depoimentos foram fundamentais para que ela fosse denunciada à Justiça.