Em votação concluída na noite de terça-feira (30), membros da instituição decidiram substituir mais um integrante do Conselho Superior do Ministério Público (CSMPF) que era considerado próximo ao atual PGR. O resultado significa que Aras trabalhará com um Conselho dividido praticamente ao meio, e não terá maioria de membros alinhados a ele.
A nova composição do colegiado pode afetar a tramitação da proposta de Aras de centralizar as investigações anticorrupção e contra o crime organizado em uma unidade própria em Brasília. A ideia precisa passar pelo CSMPF.
Foram escolhidos para o Conselho na terça os subprocuradores-gerais José Bonifácio Borges de Andrada e Maria Caetana Cintra Santos. Os dois tiveram 40 votos cada. Esta não é a primeira derrota de Aras na escolha de integrantes do CSMPF: ele sofreu um revés similar na semana passada.
Na primeira rodada de votações, foram eleitos para o Conselho dois candidatos que fazem "oposição" a Aras na política interna do MPF. Mario Bonsaglia foi eleito com 645 votos, e Nicolao Dino obteve 608 apoios, derrotando procuradores considerados próximos ao atual PGR. Com a renovação, o PGR passa a ter de três a quatro votos, entre os dez integrantes do Conselho, incluindo o dele próprio, que preside o grupo.
O Conselho Superior do MPF é o colegiado máximo de deliberação do órgão. Não atua diretamente em investigações, mas pode barrar iniciativas propostas pelo PGR e que envolvam mudanças na estrutura do Ministério Público. Suas atribuições vão desde a definição dos critérios para os concursos públicos do MP até a realização de investigações disciplinares, como sindicâncias.
Dos dois eleitos na terça, um recebeu o apoio de Aras. Maria Caetana Cintra Santos já integrava o colegiado e pleiteava a reeleição. O outro escolhido não é próximo ao PGR. José Bonifácio Borges de Andrada derrotou o subprocurador Hindemburgo Chateaubriand Pereira Diniz, que buscava a reeleição. Hindemburgo é o atual secretário de cooperação internacional da PGR, indicado por Aras.
Um integrante do Conselho, ouvido sob reserva pela BBC News Brasil, avalia que Aras deve ter mais dificuldades a partir de agora. Antes, o colegiado costumava se dividir em cinco a cinco, com voto de minerva do PGR em caso de empate. Agora, a tendência é que o PGR tenha quatro ou três votos, a depender do tema em debate.
"Para manter o mesmo equilíbrio de antes, ele (Aras) precisava emplacar dois nomes simpáticos a si (nesta terça). Se não era uma situação totalmente confortável, era pelo menos administrável. Agora, ele vai estar em minoria. De seis a quatro, ou de sete a três, dependendo do tema", diz o procurador.
"Quem eram os candidatos de Aras? Hindemburgo, que é secretário (de Cooperação Internacional) na gestão dele, e foi derrotado; e a Lindôra (Araújo), que é o braço direito do Aras. Mas ela (Lindôra) se desgastou com aquela visita atabalhoada à Lava Jato de Curitiba (na semana passada) e retirou a candidatura", diz esse profissional.
Lindôra de Araújo é a coordenadora da Lava Jato na PGR. Ela retirou a candidatura no domingo, depois da repercussão negativa de sua ida a Curitiba. Ela requisitou acesso a informações sigilosas da Força-Tarefa da Lava Jato paranaense, atitude mal recebida pelos investigadores. Quatro procuradores renunciaram aos postos depois da visita dela.
"Depois que a Lindôra retirou a candidatura, o Aras se movimentou para apoiar a Maria Caetana. Mas ela, até ontem, não contava com o apoio de Aras. Então não sei até que ponto ela (Maria Caetana) vai ser próxima dele. Foi apoiada pelo PGR, mas também por pessoas independentes", diz o conselheiro.
Outro integrante do colegiado diz que essas mudanças só poderão ser verificadas de fato em setembro, quando está marcada a primeira reunião do Conselho com a nova composição.
A votação de terça-feira foi restrita aos subprocuradores-gerais, profissionais que estão no terceiro e último degrau da carreira no MPF. Enquanto na semana passada os cerca de 1.150 procuradores em atividade puderam votar, na terça foram consultados apenas os 73 subprocuradores-gerais da República.
'Superpoderes' para investigar políticos
O resultado de terça-feira põe em risco a tramitação de uma das principais iniciativas de Aras até aqui: a criação de uma Unidade Nacional de Combate à Corrupção e ao Crime Organizado (Unac), que centralizaria em Brasília as informações sobre este tipo de investigação.
O projeto é visto como uma forma de concentrar poderes na PGR, e é criticado por adversários de Aras como um ataque à independência dos demais procuradores, garantida pela Constituição. A Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR), que é uma espécie de sindicato dos membros do MPF, também se posicionou contra a ideia.
A proposta implicaria a fusão das equipes da Lava Jato no Rio, em São Paulo e em Curitiba, além da força-tarefa da operação Greenfield, em Brasília. O coordenador da Unac seria escolhido pelo PGR, e teria mandato de dois anos.