Número de donas de casa candidatas aumenta 131% no país

Dona de casa é quarta ocupação mais declarada por candidatos no país.

Josefina, Dalva, Célia e Suelane: donas de casa e candidatas a vereadora nas eleições municipais de suas cidades em 2012. | Reprodução/TSE
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Com a cota obrigatória de 30% para candidaturas de um dos sexos, o número de candidatas donas de casa mais que dobrou nestas eleições, segundo levantamento junto aos dados de candidaturas do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). É a quarta ocupação mais declarada, passando de 9.869 candidaturas na última eleição para 22.789 em 2012 ? aumento de 131%.

As donas de casa representam 4,8% do total de candidatos, atrás apenas dos servidores públicos municipais, agricultores e comerciantes. Em 2008, a ocupação aparecia em 9º lugar.

Os dados mostram que o aumento ocorre em razão do elevado número de candidatas a vereadora. São 22.536 inscritas, 98,9% do total. Em 2008, eram 9.546 candidatas.

Para prefeita e vice, no entanto, o número caiu. Neste ano, 81 donas de casa (0,35% do total de candidaturas nessa ocupação) concorrem ao cargo do Executivo. Nas últimas eleições, eram 102 candidatas com esta ocupação. Para vice, agora são 172 candidaturas (0,75% do total). Em 2008, havia 221 postulantes ao cargo.

"Laranjas"

Para o cientista político José Eustáquio Alves, a explicação mais provável para o aumento significativo e para a disparidade entre os cargos disputados é a obrigatoriedade da cota sexual nestas eleições.

Agora, a lei exige 30% dos candidatos de um dos sexos nos partidos e coligações na disputa para vereador. A regra provocou um aumento na participação feminina nas eleições. O Tribunal Superior Eleitoral afirma que a coligação ou partido que não cumprir a cota obrigatória poderá ter a lista inteira de candidatos rejeitada.

?Esses partidos não investiram na formação de mulheres, não prepararam. Então, para preencher a cota, eles lançam a famosa candidata ?laranja?. Lançam a mãe, a irmã, até a empregada doméstica, só para preencher?, afirma Eustáquio Alves.

Sou do lar"

?Fui convidada para ser candidata, por ser mulher, porque tenho ficha limpa e sou filiada ao partido?, diz Josefina Rocha de Oliveira, a Tia Fina (PSB), que pela primeira vez disputa o cargo de vereadora no município de Nova Iguaçu, Rio de Janeiro. A cidade é a campeã em candidaturas de donas de casa em todo o país, com 55 postulantes a cargos eletivos.

Viúva, 61 anos, a moradora do bairro Corumbá afirma não fazer campanha por causa da artrose e também por não ter dinheiro. A propaganda é boca a boca: o pedido de voto é feito aos parentes e amigos. Ela atende ao telefone em casa. ?Eu sou do lar, não tenho profissão não.?

Tia Fina também conta não frequentar reuniões de partido. Mesmo assim, diz levantar a bandeira dos animais. ?Eu nunca me imaginei [candidata], aí de repente me apareceu essa chance. A minha chance de ganhar é muito, muito pouca mesmo. Mas eu tenho muita fé dentro do meu coração. Vai que alguém já viu o que eu desejo, e um outro político faz.?

Sobre o preenchimento das cotas, ela diz: ?Pra eles [partidos] até pode ser só para preencher. Não estão levando fé em mulher, mas a mulher está dominando. A sabedoria é delas. Olha a nossa presidente. Se eu for eleita, eu vou fazer e acontecer.?

De casa em casa

No município de Abaetetuba, nordeste do Pará, cinco candidatas da coligação União por Abaeté (PR-PRB) são donas de casa, de um total de 30 aspirantes.

"A gente fez um trabalho forte em cima de filiação", afirma Keimenson Nascimento, diretor jurídico do partido no estado. "A filiação das mulheres é dez vezes menor que a de homens no Pará, e tínhamos que cumprir a cota de 30% de candidatas. No caso do PRB, a quantidade de donas de casa é decorrente disso", revela.

"É uma exigência legal. Tentamos fazer com que as mulheres se interessem pela política, fomos de casa em casa. Por isso, temos muitas donas de casa, que são parte expressiva do eleitorado, assim atingimos este tipo de eleitor. Fazemos este trabalho (de atrair mulheres para o partido) há um ano", afirma.

Vontade própria

Em Bandeira do Sul (MG), a dona de casa Maria Dalva de Oliveira Rodrigues, 53 anos, também disputa uma vaga pelo PSD na Câmara Municipal pela primeira vez. Sua coligação tem cinco candidatas com a mesma ocupação, de um total de 18 postulantes ao cargo.

Ela diz que sempre trabalhou nas eleições e decidiu concorrer por causa do histórico político da família. ?Agora recebi o convite para me candidatar?, conta. ?Antes eu não podia porque morava na roça, tinha filhos pequenos. Agora, cuido apenas do meu neto, então tenho mais tempo para tentar melhorar Bandeira do Sul.?

Celia Maria de Araújo, 51 anos, também é candidata no município pela primeira vez. ?Eu já tinha essa vontade e neste ano o partido me convidou", diz a candidata do PSD.

"Acredito que não tenha sido apenas para cumprir a cota de 30% de mulheres candidatas, mas, de qualquer maneira, tenho ideias muito bacanas para o município, especialmente no setor da educação e da saúde?, afirma.

A dona de casa Suelane dos Santos Silva, candidata em Jaboatão dos Guararapes (PE) pelo PSC, também diz que resolveu disputar por vontade própria. ?Vou de porta em porta, não tenho nenhum meio de investir. Tenho ajuda de amigos, parentes e pessoas da comunidade?, afirma. ?Eu sempre quis, sempre tive vontade só que não tinha tempo.?

Prejuízo eleitoral

Segundo José Eustáquio Alves, apenas preencher a cota, embora não seja ilegal, pode ser "um tiro no pé" para os partidos. Por isso, ele afirma apostar na racionalidade por parte das legendas.

?Se uma mulher é simplesmente dona de casa, se não tem experiência pública, é muito difícil de ela se eleger, não tem capital social, capital político?, diz o cientista político. ?O partido que não investir na mulher vai ficar prejudicado no seu próprio desempenho eleitoral.?

?Eu defendo a ideia de que se as mulheres são metade da população, se já superaram os homens em termos de nível educacional, se estão no mercado de trabalho, têm uma participação tão importante, não tem sentido manter na política um ?clube do bolinha??, completa o especialista.

?Por isso eu acho que esse aumento é muito positivo, porque está se lutando há muito tempo por isso?, conclui.

Pelo país

Dona de casa também é a profissão declarada em que há a maior diferença entre mulheres e homens nesta eleição. São 22.709 candidatas mulheres para 80 candidatos que se declararam "donos de casa", do sexo masculino.

Embora a participação feminina tenha aumentado nesta eleições, elas ainda são minoria na maioria dos profissões declaradas. O número de candidatos homens supera o de mulheres em 199 de um total de 243 profissões entre as inscritas, ou 82% do total.

Entre as profissões em que a quantidade de mulheres candidatas supera proporcionalmente a de homens estão, além de dona de casa, a de empregada doméstica, governanta, secretária e datilógrafa, assistente social, faxineira, telefonista e fonoaudióloga.

Nenhuma profissão é exclusividade das mulheres. Mas há aquelas apenas declaradas por homens. São elas: funileiro, bombeiro e instalador de gás, água, esgoto e assemelhados, chaveiro, leiturista, ministro de estado, relojoeiro e montador de instrumento de precisão, carvoeiro, piloto de aviação comercial, navegador, mecânico de voo e assemelhados, guardador de veículos, trabalhador de fabricação, vulcanização e reparação de pneumáticos, meteorologista, capitalista de ativos financeiros, paramédico, físico, geofísico, diplomata e antropólogo.

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