Embora o governo acredite em vitória na definição do novo salário mínimo e na manutenção da atual fórmula para o reajuste, senadores e deputados já preparam armadilhas para arrastar a discussão no Congresso ou mexer nos planos do Planalto para o tema.
Em contrapartida, governistas também trabalham em formas alternativas de acelerar a votação, para conter, o quanto antes, eventuais dissidências ou alterações da proposta original.
Nesta terça-feira (8), o governo articulou reuniões entre líderes e representantes do Planalto para tentar garantir apoio para aprovar o mínimo em R$ 545 e consolidar em lei a regra de reajuste (inflação do ano anterior somada ao crescimento do PIB de dois anos antes).
Mas, em vez de fechar questão, acabou obtendo surpresas. No Senado, o PMDB, principal aliado, saiu de uma reunião da base propondo ?formas de compensação? para anos como 2011, em que, segundo a regra, não haveria ganho real no valor, mas somente reposição da inflação.
Entre as ?salvaguardas?, o líder do partido na Casa, Renan Calheiros (AL), propôs que os Estados diminuam impostos sobre alimentos da cesta básica.
- O governo [federal] desonerou os produtos da cesta básica dos impostos federais. Nós pretendemos fazer o mesmo com o ICMS [Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços] aos impostos estaduais. Isso daria uma elevação do poder de compra do salário mínimo de 20%.
O governo considera a medida complicada: o imposto é a principal fonte de receita dos Estados e há briga entre aqueles produtores e consumidores por sua arrecadação. A ?solução? seria a União tirar do próprio bolso para compensar aqueles que perdem mais.
O PMDB também estuda incluir na regra outras maneiras de dar ganho real ao salário, mesmo quando a economia não crescer no ano retrasado (como ocorreu em 2009). Contrário à ideia, o ministro das Relações Institucionais, Luiz Sérgio, argumentou que isso poderia abrir um precedente perigoso para os trabalhadores.
- Quando você tiver um crescimento muito alto, você vai estar dando o argumento para aqueles que são contrários a essa política de dizer que o Orçamento não aguenta, que os municípios podem quebrar. O ideal é não abrir janela para exceções.
Calheiros ainda disse que precisa ser ?discutida? a decisão do governo em fixar a regra de reajuste só até 2014. Até a semana passada, o plano era que a política valesse até 2023. Sobre esse novo imbróglio, o governo argumenta que não pode comprometer a próxima gestão.
Câmara
Para acalmar os ânimos, o líder do governo na Câmara, deputado Cândido Vaccarezza (PT-SP), disse que o objetivo continua sendo manter a política de valorização do mínimo para além de 2014.
- Digamos que o mundo entre numa crise e a gente passe cinco anos sem crescimento positivo. Então você não vai dar ganho? Cairia por terra a recuperação do salário mínimo até 2023.
Na Câmara, onde o maior número de parlamentares aumenta o risco de traições dentro da base governista, Vaccarezza já diz ter conseguido o apoio formal de dez partidos aliados. Falta convencer o PDT, historicamente ligado às centrais sindicais, que pressionam por R$ 580.
Para tentar ganhar o aliado rebelde, Vaccarezza garantiu que, em troca da aprovação do mínimo em R$ 545, o governo irá corrigir a tabela do imposto de renda, outra reivindicação que os sindicalistas não abrem mão.
A tendência é que as alíquotas sejam corrigidas em 4,5%, centro da meta de inflação do ano passado. Outra peça de barganha é a retroatividade: os salários seriam pagos desde janeiro, independentemente da data da aprovação final.
O último desafio é driblar a oposição. Mesmo em número bem menor na Câmara, PSDB, DEM e PPS, principalmente, tentarão arrastar o processo de votação. A ideia é ganhar tempo para conquistar dissidentes da base aliada.
O líder do DEM, ACM Neto (BA), já adiantou que vai convidar especialistas, autoridades, sindicatos e empresários para discutir um valor maior.
- Essa pressa não é boa. Se o próprio governo quer tratar de uma regra que valha para quatro anos, não pode querer aprovar isso em quatro dias.
Para apressar a votação e conter resistências, os governistas agora preparam um "jeitinho": juntar numa só proposta a definição do valor e as regras para o reajuste. Até então, o plano era que as duas mudanças tramitassem separadamente: a primeira via medida provisória e a segunda por projeto de lei.
O objetivo do governo é votar todo o pacote até o final de fevereiro. A ideia é aprovar um requerimento de urgência para o projeto de lei com as duas mudanças (valor e regra) para ser votado em sessões extraordinárias. Nas sessões normais, a pauta já está trancada por dez medidas provisórias. A do mínimo poderia ser finalmente aprovada só em julho.