O governo do Estado de São Paulo gastou mais que o dobro do governo federal para fazer publicidade oficial em jornais que não existem.
Entre 2008 e 2010, durante a gestão do ex-governador José Serra (PSDB), o Palácio dos Bandeirantes desembolsou pelo menos R$ 309 mil para pagar anúncios nos jornais "O Dia de Guarulhos", "Jornal do ABC Paulista" e "Diário de Cubatão", todos fictícios.
Esse valores, corrigidos pela inflação pela reportagem, estão listados num relatório de gastos com publicidade do Estado obtido pela Folha no primeiro semestre deste ano com base na Lei de Acesso à Informação.
As três publicações citadas são vinculadas à Laujar Empresa Jornalística Ltda, com sede registrada num imóvel vazio em São Bernardo do Campo, no ABC paulista.
A Laujar é a mesma empresa que, conforme mostrou a Folha no domingo passado, recebeu R$ 135,6 mil da Presidência da República por anúncios em cinco jornais inexistentes: os três que aparecem citados como veiculadores de anúncios do governo paulista, mais "Gazeta de Osasco" e "O Paulistano".
Após a reportagem sobre os gastos do governo federal, a Secom (Secretaria de Comunicação Social da Presidência) anunciou ter pedido uma investigação à Polícia Federal sobre o caso.
Disse ainda que, caso constate irregularidades "tomará as atitudes judiciais cabíveis" contra a Laujar.
Os jornais que receberam verba publicitária dos governos paulista e federal inexistem em bancas das cidades citadas em seus títulos.
Eles não são cadastrados em nenhuma entidade do meio editorial e são totalmente desconhecidos de jornalistas e diversos jornaleiros consultados nessas regiões.
Além disso, exemplares usados para "provar" a existência das publicações têm sinais de serem forjados. Diferentes publicações têm exatamente os mesmos textos.
Uma das "reportagens" num jornal com data de 15 de março na capa cita declarações de um ministro que foram dadas no próprio dia 15. É improvável que a impressão tenha ocorrido na data informada, ainda mais no caso de um jornal pequeno.
Outra estranheza são anúncios da Unimed que, segundo a empresa de plano de saúde, nunca foram contratados.
O governo paulista afirma que anunciou nesses jornais por orientação da Contexto, uma das agência de publicidade que prestam serviço ao Palácio dos Bandeirantes.
A Contexto confirma ser "responsável pelo plano de mídia do Estado". Uma representante da empresa afirmou que irá verificar a documentação sobre esses jornais e "tomará as providências cabíveis" em caso de irregularidade (leia o texto abaixo).
O dono da Laujar, Wilson Nascimento, diz que os jornais existem. Em documento enviado à Secom, a empresa informou que suas publicações, vendidas por R$ 2,50, têm tiragem total de 250 mil exemplares. Nascimento alega que elas circulam de terça a sábado, mas não quis informar em quais bancas seria possível encontrá-las.
REPERCUSSÃO
Após a publicação da reportagem que listava os gastos da Presidência com publicações-fantasmas, o senador Álvaro Dias (PSDB-PR) usou a tribuna do Senado para pedir explicações à ministra Helena Chagas, da Secom.
Ele ressaltou que a empresa beneficiada fica no ABC Paulista, "a morada do PT", e disse ter solicitado uma auditoria dos gastos ao TCU (Tribunal de Contas da União).
Outro que demonstrou preocupação com o caso foi o deputado paranaense Rubens Bueno, líder do PPS na Câmara: "Com tanta perseguição contra a mídia por causa do mensalão, o governo do PT acaba de criar o PIF, Partido da Imprensa Fantasma", disse, "Resta agora saber quem é o padrinho desse fantasminha camarada".
Dias e Bueno foram procurados para comentar o caso paulista. A assessoria do senador prometeu avisá-lo, mas não deu resposta ao pedido de entrevista. Rubens Bueno, segundo sua assessoria, estava incomunicável.