Liana Chaib publica artigo sobre participação de mulheres para vaga no TRT

“As mulheres que concorreram à lista tríplice da nossa Corte têm, no mínimo, coragem, ingrediente tão necessário quanto o saber jurídico”, diz trecho do artigo

liana | reprodução
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A desembargadora do Tribunal Regional do Trabalho da 22ª Região, Liana Chaib, publicou artigo repercutindo a escolha dos nomes que compõe a lista tríplice, que será encaminhada ao presidente Jair Bolsonaro (PL), para ocupar uma vaga de desembargador pelo Quinto Constitucional da Advocacia do Tribunal. 

A vaga em aberta era ocupada pelo desembargador Wellington Jim Boavista, que deixa o tribunal após se aposentar. A desembargadora do TRT-PI deu foco especial a participação das candidatas mulheres que colocaram seus nomes a disposição para ocupar o cargo.

Candidatos aguardam votação para escolha de nomes que disputavam lista tríplice no TRT-PI - Foto: Divulgação/Ascom

LEIA O ARTIGO NA ÍNTEGRA:

As Catilinárias e as mulheres

“Até quando, Catilina, abusarás da nossa paciência ?

“ Quanto zombará de nós ainda teu atrevimento? Aonde vai tua desenfreada insolência? Com essas palavras Cícero abre um dos seus discursos mais famosos: As Catilinárias .

Cícero foi um político que nasceu em Arpino, no Lácio (106 a.C) e que, como Senador, enfrentou o maior desafio do seu tempo: combater a Conjuração de Catilina, um aristocrata romano que queria usurpar, sorrateiramente, o poder supremo da República e tornar-se Cônsul.   

Cícero, ao descobrir a intenção de Catilina de incendiar Roma, com a tentativa de causar o caos, profere no Senado a Primeira Catilinária, no dia 08 de novembro de 63 a.C.

As cortinas se fecham e é chegada a hora de perguntar, de refletir : parafraseando Cícero,  até quando, ó Catilina, as mulheres serão atacadas em sua honra, em seu íntimo, quando, corajosamente, altivas e destemidamente, resolvem ocupar as cúpulas do Poder? Até quando assistiremos, atônitas e paralisadas o enxovalhar de suas mais íntimas entranhas, na tentativa de eliminar a sua voz? Que honra defendemos? Que reputação ilibada estamos dispostos a servir e reverenciar? A que ou a quem o “ notável saber jurídico” deve servir? Deve estar a serviço da injustiça, da vaidade ou da perpetuação dos preconceitos?

Tal como a indignação do Cônsul Cícero foi a  de Jesus de Nazaré ao confrontar Maria Madalena a seus acusadores.

Aprendi com o meu pai, a 1ª lição sobre ser juiz, quando passei no concurso público, ainda para a justiça comum. A frase dele ainda hoje retumba  aos meus ouvidos: “o pior juiz é o juiz pusilânime, o juiz medroso, o juiz covarde. Esse, dizia ele, não honra a toga que veste. O juiz medroso que decide baseado nas intrigas, fuxicos e fofocas também não possui um dos mais necessários requisitos para ser juiz: a independência. Ser independente é não ser acorrentado pelo juízo da sociedade, mas apenas ser conduzido por sua consciência.   

E vejo quão grandioso é esse ensinamento.   Então, as mulheres que concorreram à lista tríplice da nossa Corte têm, no mínimo, coragem, ingrediente tão necessário quanto o saber jurídico.

Há que se ter coragem para ir buscar um sonho, ainda que para alguns seja inalcançável; há que se ter coragem para enfrentar um mundo preconceituoso; há que se ter coragem para saber, que a partir de uma disputa, sua vida pessoal haverá  de ser radiografada e maculada.  Há de se ter coragem para ser mulher.

A coragem de todas as mulheres que disputaram uma vaga deve ser digna de elogio e motivo de esperança para a sociedade e não motivo de vergonha porque não chegaram lá.

Toda mulher que  inicia um caminho faz história; faz história porque inspira e inspirar  é o maior legado que podemos deixar. Mostrar que o percurso é tão valioso quanto a chegada. Com ele aprendemos, com ele analisamos nossos erros e acertos e, a partir deles, podemos refazer. O poder da recomposição nos molda, nos torna árvores frondosas que, mais cedo ou mais tarde, proporcionarão sombra a tantos outros.

Presto uma homenagem a todas elas. Todas, sem exceção de nenhuma, e abro uma parênteses para mencioná-las nominalmente, Dra. Olívia Brandão, Dra. Heloisa Hommerding e Dra. Tácia Nunes, cada uma   merece meu respeito  e admiração. Todas são dignas e honradas. Todas são merecedoras de ocupar qualquer lugar, sobretudo um Tribunal. Todas enfrentaram bravamente uma campanha e foram vitoriosas no órgão de classe a qual pertencem: essa é uma vitória digna de reconhecimento, aplausos e confetes.

Todas devem manter a altivez, própria de mulheres honradas. Uma trilha percorrida nunca é em vão. Deixamos nossa marca, deixamos nossa pegada, para que alguém possa seguir.

Portanto, agora que as cortinas se fecharam, devo às mulheres esta homenagem e termino com uma frase de uma mulher que para mim é um ícone, uma luz que mantém acesa a esperança na humanidade, que se chama Michele Obama: “Espero que todas vocês acreditem na vossa história...espero que reconheçam o poder da vossa voz.”

Todas nos ensinaram, cada uma à sua maneira.

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