Com o voto da ministra Cármen Lúcia nesta quarta (5), a maioria dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) já votou pela condenação da acionista e ex-presidente do Banco Rural Kátia Rabello e do ex-vice-presidente José Roberto Salgado.
Seis ministros entenderam que eles são culpados de gestão fraudulenta no comando da instituição: Joaquim Barbosa, Ricardo Lewandowski, Rosa Weber, Luiz Fux, Dias Toffoli e Cármen Lúcia.
Nesta quinta, devem votar os quatro ministros que ainda não se manifestaram sobre esse tópico do julgamento (gestão fraudulenta) ? Gilmar Mendes, Marco Aurélio, Celso de Mello e Ayres Britto
Até a proclamação do resultado, no final do julgamento, qualquer um dos ministros pode mudar o voto.
A gestão fraudulenta é prevista na lei de crimes contra o sistema financeiro e pode resultar em prisão de 3 a 12 anos. A dosimetria da pena (cálculo de quanto tempo cada condenado ficará preso) será feita ao final do julgamento.
Kátia Rabello e José Roberto Salgado foram acusados pelo Ministério Público de conceder, sem observar as regras do Banco Central, empréstimos a agências de Marcos Valério, apontado como operador do mensalão, o suposto esquema de compra de votos no Congresso durante o governo de Luiz Inácio Lula da Silva.
Dos dez ministros da corte ? o Supremo ficou com um magistrado a menos após a aposentadoria de Cezar Peluso ?, cinco já votaram pela condenação do atual vice-presidente do Banco Rural Vinícius Samarane por gestão fraudulenta. O único a se manifestar contra foi Ricardo Lewandowski, que entendeu que Samarane era "um mero empregado" na época dos empréstimos fraudulentos.
Além disso, cinco votaram pela absolvição da ex-vice-presidente Ayanna Tenório por entender que não havia provas da participação nas fraudes descritas pelo Ministério Público Federal no Banco Rural.
Embora com decisão parcial sobre a cúpula do banco, 7 dos 37 réus do processo já foram condenados, cinco deles na análise do item sobre desvio de recursos públicos (veja como cada ministro votou): o deputado e ex-presidente da Câmara João Paulo Cunha, o ex-diretor do Banco do Brasil Henrique Pizzolato, Marcos Valério e os sócios Ramon Hollerbach e Cristiano Paz.
As acusações
Segundo a denúncia, o Banco Rural repassou R$ 29 milhões às empresas de Marcos Valério e R$ 3 milhões ao PT por meio de empréstimos fictícios.
Para o MP, Kátia e Salgado autorizaram empréstimos sem analisar as garantias. Ainda conforme a Procuradoria, Ayanna Tenório autorizou a renovação de empréstimos, e Samarane omitiu do sistema do Banco Central os dados sobre os saques de dinheiro feitos pelo grupo de Valério.
"Gestão tenebrosa"
Ao votar, o ministro Luiz Fux afirmou que a gestão do Banco Rural era "tenebrosa". "Na verdade, infelizmente, a entidade bancária serviu de uma verdadeira lavanderia de dinheiro, esse deveria ser o nome, nem gestão fraudulenta, nem gestão temerária, deveria ser gestão tenebrosa", disse.
Para Dias Toffoli, há provas de que a cúpula do banco não cumpriu as regras do Banco Central. "Houve inequívoca prática de condutas divorciadas das normas e regulamentos que cocernem à atividade bancária", argumentou Toffoli.
Assim como Fux, a ministra Rosa Weber entendeu que só Kátia, Salgado e Samarane, que detinham o poder das decisões da instituição, cometeram o crime.
"Mal comparando, nos crimes de guerra, em geral punem-se os generais estrategistas. No mesmo modo, nos crimes administrativos, a culpa recai sobre seus administradores. Desse modo, no crime com a utilização da empresa, o autor é o dirigente ou os dirigentes que podem impedir que a ação ocorra."
Em relação a Samarane, Rosa destacou que ele teve um papel menor e, por isso, afirmou que a dosimetria deve levar a questão em conta.
Primeiro a falar nesta quarta, o revisor Ricardo Lewandowski disse que "não ficou convencido" da participação de Ayanna e que Samarane era "um mero empregado".
"De pai para filho"
Ao analisar a conduta de Kátia Rabello e José Roberto Salgado na segunda (3), Lewandowski disse que o Banco Rural tentou "ludibriar" o Banco Central.
"As operações de mútuo do Banco Rural traduziram em um ato de gestão fraudulenta. Isso porque a classificação do risco teve objetivo de ludibriar o Banco Central [...], mascarar os números, fazendo com que o banco contasse com uma imerecida credibilidade junto ao mercado", afirmou o revisor. Ele comparou a concessão dos empréstimos a um negócio "de pai para filho".
Relator da ação penal, o ministro Joaquim Barbosa falou na semana passada e afirmou que os empréstimos ao PT e a Marcos Valério não foram contabilizados nos registros oficiais do Banco Rural e que a cobrança foi feita somente depois do escândalo.
?Senhores ministros, à luz de todo o acervo probatório que veio à tona, verifica-se que, na realidade, como bem ressalta a acusação, o Banco Rural só cobrou os valores dos empréstimos após o escândalo do mensalão e assim agiu porque os empréstimos não eram para serem pagos. Essa afirmação de que os valores milionários somente foram cobrados após o mensalão foi comprovada pela própria Kátia Rabello", já havia dito relator na semana passada.
"Ação orquestrada"
O ministro-relator afirmou ainda que o crime de gestão fraudulenta foi praticado em concurso de pessoas, por todos os quatro ex-dirigentes do Banco Rural.
?Com efeito, é preciso lembrar que o crime foi praticado em concurso de pessoas, numa ação orquestrada [...] típica de um grupo criminoso. Pela divisão de tarefas, cabe a cada qual cumprir determinadas funções.?