O ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), surpreendeu aos colegas e advogados com uma mudança em seu voto no julgamento do mensalão nesta segunda-feira. Antes de apreciar a questão envolvendo a perda do mandato de parlamentares, Marco Aurélio acabou absolvendo quatro réus que já haviam sido condenados pelo plenário.
O ministro afirmou que fez uma nova análise dos autos do processo e constatou que não haveria provas de que o ex-deputado Pedro Corrêa (PP-PE), o ex-assessor do partido João Cláudio Genu e Enivaldo Quadrado, então sócio dono da corretora Bônus Banval, teriam se reunido em torno de uma organização criminosa. Com isso, acabou absolvendo os três do crime de formação de quadrilha.
Situação semelhante foi verificada, ainda segundo o ministro, em relação ao advogado Rogério Tolentino. "A premissa é a de que, reexaminando a situação, conclui que (Tolentino) não estaria integrado à associação propriamente dita, no que a participação se fez ligada unicamente ao empréstimo junto ao (banco) BMG", disse.
O novo posicionamento de Marco Aurélio provocou um empate no julgamento dos quatro réus, o que leva à absolvição e a alterações nas penas e regimes de cumprimento da pena. No entanto, não haverá alteração nas multas, uma vez que o crime de formação de quadrilha não prevê pena pecuniária.
Rogério Tolentino foi condenado anteriormente a oito anos e cinco meses por corrupção ativa, lavagem de dinheiro e quadrilha. Sem o crime de quadrilha, a pena será reduzida para seis anos e dois meses, e o regime passa do fechado para o semiaberto. Situação semelhante passará o ex-deputado Pedro Corrêa. Condenado anteriormente a nove anos e cinco meses por corrupção passiva, lavagem de dinheiro e formação de quadrilha, a pena será reduzida para sete anos e dois meses, e ele também cumprirá pena no regime semiaberto.
João Cláudio Genu foi condenado anteriormente a sete anos e três meses por corrupção passiva, lavagem de dinheiro e formação de quadrilha. Sem a condenação por quadrilha, a pena será reduzida para cinco anos. No caso de Genu, não há mudança de regime, que continua semiaberto.
Enivaldo Quadrado, que foi condenado anteriormente a cinco anos e nove meses por lavagem de dinheiro e formação de quadrilha, teve a pena alterada para três anos e seis meses. Como a punição é pequena, é possível que ele pegue alguma pena alternativa.
O mensalão do PT
Em 2007, o STF aceitou denúncia contra os 40 suspeitos de envolvimento no suposto esquema denunciado em 2005 pelo então deputado federal Roberto Jefferson (PTB) e que ficou conhecido como mensalão. Segundo ele, parlamentares da base aliada recebiam pagamentos periódicos para votar de acordo com os interesses do governo Luiz Inácio Lula da Silva. Após o escândalo, o deputado federal José Dirceu deixou o cargo de chefe da Casa Civil e retornou à Câmara. Acabou sendo cassado pelos colegas e perdeu o direito de concorrer a cargos públicos até 2015.
No relatório da denúncia, a Procuradoria-Geral da República apontou como operadores do núcleo central do esquema José Dirceu, o ex-deputado e ex-presidente do PT José Genoino, o ex-tesoureiro do partido Delúbio Soares e o ex- secretário-geral Silvio Pereira. Todos foram denunciados por formação de quadrilha. Dirceu, Genoino e Delúbio respondem ainda por corrupção ativa.
Em 2008, Sílvio Pereira assinou acordo com a Procuradoria-Geral da República para não ser mais processado no inquérito sobre o caso. Com isso, ele teria que fazer 750 horas de serviço comunitário em até três anos e deixou de ser um dos 40 réus. José Janene, ex-deputado do PP, morreu em 2010 e também deixou de figurar na denúncia.
O relator apontou também que o núcleo publicitário-financeiro do suposto esquema era composto pelo empresário Marcos Valério e seus sócios (Ramon Cardoso, Cristiano Paz e Rogério Tolentino), além das funcionárias da agência SMP&B Simone Vasconcelos e Geiza Dias. Eles respondem por pelo menos três crimes: formação de quadrilha, corrupção ativa e lavagem de dinheiro.
A então presidente do Banco Rural, Kátia Rabello, e os diretores José Roberto Salgado, Vinícius Samarane e Ayanna Tenório foram denunciados por formação de quadrilha, gestão fraudulenta e lavagem de dinheiro. O publicitário Duda Mendonça e sua sócia, Zilmar Fernandes, respondem a ações penais por lavagem de dinheiro e evasão de divisas. O ex-ministro da Secretaria de Comunicação (Secom) Luiz Gushiken é processado por peculato. O ex-diretor de Marketing do Banco do Brasil Henrique Pizzolato foi denunciado por peculato, corrupção passiva e lavagem de dinheiro.
O ex-presidente da Câmara João Paulo Cunha (PT-SP) responde a processo por peculato, corrupção passiva e lavagem de dinheiro. A denúncia inclui ainda parlamentares do PP, PR (ex-PL), PTB e PMDB. Entre eles o próprio delator, Roberto Jefferson.
Em julho de 2011, a Procuradoria-Geral da República, nas alegações finais do processo, pediu que o STF condenasse 36 dos 38 réus restantes. Ficaram de fora o ex-ministro da Comunicação Social Luiz Gushiken e o irmão do ex-tesoureiro do Partido Liberal (PL) Jacinto Lamas, Antônio Lamas, ambos por falta de provas.
A ação penal começou a ser julgada em 2 de agosto de 2012. A primeira decisão tomada pelos ministros foi anular o processo contra o ex-empresário argentino Carlos Alberto Quaglia, acusado de utilizar a corretora Natimar para lavar dinheiro do mensalão. Durante três anos, o Supremo notificou os advogados errados de Quaglia e, por isso, o defensor público que representou o réu pediu a nulidade por cerceamento de defesa. Agora, ele vai responder na Justiça Federal de Santa Catarina, Estado onde mora. Assim, restaram 37 réus no processo.