No momento em que o País vive a pior crise hídrica da história, o SNM (Sistema Nacional de Meteorologia) teve as operações encerradas pelo governo federal. O órgão reunia os principais institutos da área em três ministérios e nasceu há pouco mais de quatro meses para facilitar as previsões e dividir funções sobrepostas do setor na esfera pública. No entanto, a pedido do MCTI (Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações), a Secretaria Especial de Assuntos Estratégicos da Presidência da República barrou a continuidade dos trabalhos e tenta colocar em operação no lugar do SNM uma comissão criada há 18 anos.
Com a medida, o governo tira de operação um órgão enxuto criado em maio deste ano para "resultar em uma maior eficiência na utilização dos recursos escassos, bem como uma padronização de procedimentos na garantia da segurança alimentar e energética", como divulgaram à época o Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) do MCTI; o Inmet (Instituto Nacional de Meteorologia), do Ministério da Agricultura; e o Censipam (Centro Gestor e Operacional do Sistema de Proteção da Amazônia), da Defesa.
Em substituição, quer retomar a Comissão de Coordenação das Atividades de Meteorologia, Climatologia e Hidrologia. Tudo isso, a pouco mais de um mês da 26ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, a COP26, a ser realizada em novembro, em Glasgow, na Escócia.
Criada em março de 2003, no início do governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), e regulamentada apenas em março de 2007, a comissão nunca operou. Inchada, deveria contar com 22 representantes - entre eles Inmet, Inpe e Censipam. Em contrapartida, dias após ser apresentado, em maio deste ano, o SNM emitiu seu primeiro alerta de emergência hídrica. Por meio do acompanhamento meteorológico para o setor elétrico brasileiro, alertou que as perspectivas climáticas indicavam que a maior parte da região central do País entraria em seu período de menor volume de chuvas na história entre maio e setembro deste ano.
O alerta apontou o pior cenário hídrico para a bacia do Rio Paraná no período, foi confirmado nos meses seguintes e ligou o sinal vermelho no governo para a ameaça de apagão. Medidas para a redução de consumo foram anunciadas e até o presidente Jair Bolsonaro apelou para a economia, pedindo que brasileiros apaguem pontos de luz, utilizem escadas e tomem banhos frios.
Após o alerta de maio, representantes do SNM foram incluídos em reuniões e discussões na Casa Civil sobre as emergências hidrológica e energética. Paralelamente, a SAE-PR (Secretaria Especial de Assuntos Estratégicos) passou a estudar um decreto para formalizar e instrumentalizar o SNM, que já estava em funcionamento.
No entanto, a pedido do MCTI, o processo foi encerrado e o governo passou a trabalhar para retomar a comissão, que, inclusive, deveria ter sido extinta pelo Decreto nº 9.759, de 11 de abril de 2019. No entanto, uma liminar obtida pelo PT em uma ação direta de inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal (STF) proíbe a extinção de conselhos previstos em leis que estabeleceram a organização básica dos órgãos da Presidência da República e dos Ministérios a partir de 2003 - é o caso da comissão. Com SNM parado por decisão do governo federal, o último alerta hídrico voltou a ser divulgado pelo Inmet.