Em troca de apoio político, os peemedebistas Renan Calheiros (AL) e Henrique Eduardo Alves (RN) fizeram lobby para agilizar processos de aliados na Comissão de Anistia, órgão vinculado ao Ministério da Justiça que julga pedidos de indenizações a pessoas perseguidas pela ditadura militar.
Documentos mostram que, juntos, os parlamentares, favoritos para assumir respectivamente as presidências do Senado (na sexta) e da Câmara (na segunda), pediram que 17 casos fossem analisados de forma prioritária desde 2005.
Nove processos já foram deferidos e outros três, indeferidos. Das 17 requisições, 10 foram para filiados a partidos -PT, PSDB, DEM, PP e, principalmente, PMDB.
Um dos documentos indica que Renan ganharia ajuda eleitoral como contrapartida à sua atuação no ministério.
Trata-se de uma carta de Paulo Nogueira Silva, filiado ao PMDB da Bahia, anexada pelo próprio senador no ofício enviado para a comissão.
Nela, o militante pede que o senador o ajude em um processo de seu cunhado. Em contrapartida, promete ajudar Renan pessoalmente e empenhar familiares da cidade alagoana de Pão de Açúcar nas eleições de 2006.
No dia seguinte, Renan enviou os papéis ao ministério. A resposta saiu em setembro de 2007, atendendo o pedido do cunhado -contagem de tempo do período em que exerceu mandato de vereador gratuitamente, já que a ditadura suspendeu esses pagamentos entre 1964 e 1969.
Um outro papel atesta que o colegiado deu "prioridade" a um processo, atendendo pedido feito também por Renan em favor de José Severino de Andrada, ex-vereador de Murici (AL), base eleitoral do clã Calheiros, em 2005.
Em abril de 2006, em resposta a Renan, a comissão informou: "Foi conferida prioridade ao processo", em que também foi concedida contagem de tempo de mandato de vereador sem salário. Segundo a comissão, a "prioridade" foi dada devido à idade avançada de Andrada -o que é previsto em norma.
Vereadores atingidos por atos da ditadura recorrem ao órgão federal para que o tempo de trabalho seja contado no cálculo de aposentadoria.
Advogados e procuradores consultados dizem que, se o pedido de agilização tiver contrapartida, pode haver crimes como tráfico de influência e advocacia administrativa (usar o cargo para patrocinar interesse privado na administração pública).
"Teoricamente, o poder público deveria tratar todo mundo por igual. Não deveria haver processos mais ágeis. A Constituição fala do princípio da igualdade e impessoalidade", disse o jurista Ives Gandra Martins.
Entre 2009 e 2010, Henrique Alves enviou três documentos solicitando "agilização no processo" de Roosevelt Garcia, ex-secretário do governo do Rio Grande do Norte.
O presidente da comissão, Paulo Abrão, enviou respostas ao deputado, entre elas a de que, em 2010, o caso estava em "fase de finalização".
Garcia foi declarado anistiado em 27 de outubro de 2010, quatro meses depois do último pedido do deputado. Foi autorizada indenização mensal de R$ 4.100 e retroativo de R$ 658 mil. "Nem sabia que Henrique tinha interferido", disse Garcia, ex-presidente do diretório acadêmico da faculdade de direito da UFRN, e hoje um pecuarista..
A Comissão de Anistia precisa analisar documentos antes de julgar os casos. Há processos esperando finalização desde 2002. No fim de 2011, havia 12 mil processos pendentes de análise.