O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes determinou a instauração de inquérito para apurar se o líder do governo no Senado, Eduardo Braga (PMDB-AM), cometeu desvio de verbas públicas quando era governador do Amazonas, cargo que ocupou entre 2003 e 2010, antes de se eleger senador.
O despacho de Mendes foi assinado no dia 14 de março e o inquérito foi instaurado na última quarta-feira (20).
O advogado Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, que defende o senador, afirmou que o parlamentar considera "bom" que o caso seja investigado para que se acabe com o uso político sobre o tema. Ele afirmou ainda que Eduardo Braga agiu com "regularidade" no exercício do cargo de governador.
Segundo a Procuradoria Geral da República, Braga é suspeito de peculato, formação de quadrilha e fraude em licitação em razão da desapropriação de um terreno. O imóvel foi comprado em 2003 por uma empresa de engenharia pelo valor de R$ 400 mil e, meses depois, foi desapropriado pelo governo do Amazonas, que concedeu à mesma empresa a indenização de R$ 13,1 milhões.
Para a PGR, "há indícios que apontam que o senhor Eduardo Braga teria contribuído para o desvio de vultuosa quantia dos cofres do Estado do Amazonas". Como governador, Braga assinou o decreto de desapropriação do imóvel.
O caso já foi alvo de ação civil no estado de Amazonas em 2004, que apurou se houve improbidade administrativa. A ação foi arquivada, mas o Ministério Público do Amazonas recorreu.
Eduardo Braga foi diplomado senador em 2010, e o caso foi enviado ao Supremo. Deputados e senadores só podem ser investigados por crimes pela Procuradoria Geral da República com autorização do STF.
A PGR pediu a abertura de inquérito após constatar indícios de crime na compra do imóvel. A Procuradoria pediu ainda quebra de sigilos bancários de empresas envolvidas, laudo do Instituto Nacional de Criminalística sobre o imóvel e depoimentos de pessoas envolvidas no caso. Todos os pedidos foram atendidos pelo ministro Gilmar Mendes.
"Diante da manifestação do Ministério Público Federal pela continuidade das investigações e existindo indícios que as justifiquem, defiro os pedidos formulados", diz o ministro no despacho.
Depois das provas, a Procuradoria ainda precisa decidir se denuncia ou não o senador. Se apresentar denúncia, o Supremo ainda julgará se abre ou não ação penal.
Além de Braga, também são investigados um ex-secretário de governo, um ex-procurador do Estado e cinco servidores da Secretaria da Habitação que trabalhavam na época da compra do imóvel.
O advogado de Eduardo Braga disse que as suspeitas já foram alvos de três ações civis. "Em todas as ações ficou comprovada a regularidade na transação [compra do imóvel]", disse Kakay. Ele considerou um "excesso" do procurador-geral da República, Roberto Gurgel, em retomar a investigação.
O defensor afirmou ainda que o senador vê como positiva a confecção de laudo sobre o valor do imóvel. "Para o senador, é bom que se analise para acabar com a questão, que é utilizada politicamente. Também avaliamos como positivo o laudo do instituto para mostrar que houve regularidade e a real valorização do imóvel. Estamos tranquilos com isso."
Investigação
O processo que está com o ministro Gilmar Mendes tem oito volumes e apresenta dados da ação civil pública, defesa dos investigados e informações sobre o terreno.
Nos autos, o governo do Amazonas indica que o governador somente assinou a desapropriação, que foi feita com base em laudos técnicos.
"Como se vê, a única censura e suposta improbidade do governador residira na deflagração do processo expropriatório por meio da edição de decreto declaratório de interesse social do imóvel. [...] governador agiu de boa-fé ao editar o decreto, com a crença de estar praticando ato que conta com o mais absoluto e irrestrito amparo legal."
Os dados indicam que o terreno foi adquirido por dos R$ 13,1 milhões, sendo que R$ 7,3 milhões correspondiam ao valor da terra nua e R$ 5,6 milhões ao custo das benfeitorias necessárias.
A Procuradoria diz, porém, que não há indicação de que foram realizadas benfeitorias. "Não há nos autos, no entanto, qualquer comprovação da existência de tais benfeitorias. O que se tem, em verdade, são indícios que apontam para a dispensa irregular de licitação das obras de urbanização."
Segundo o documento, as benfeitorias no imóvel foram feitas pela empresa de engenharia depois da desapropriação. O terreno seria usado para construção de casas populares.