Nos primeiros seis meses deste ano, quatro mulheres foram mortas por dia no Brasil por um atual ou ex-parceiro. No total, foram 666 vítimas de feminicídio de janeiro a junho, de acordo com dados de um levantamento inédito do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. A diretora-executiva do fórum, Samira Bueno, acredita que a violência de gênero tem proporções epidêmicas mas foi naturalizada socialmente.
O número de casos de estupro em geral e de vulnerável, com vítimas mulheres, aumentou 8,3% no país no primeiro semestre deste ano, em comparação ao mesmo período de 2020, quando houve subnotificação, em razão da pandemia. No ano passado, 24.664 mulheres foram vítimas de estupro – o número subiu para 26.709 neste ano. Em 2021, janeiro foi o mês com o maior número de registros: 4.774 casos.
O levantamento realizado pelo fórum foi divulgado em primeira mão pelo portal G1 e confirmado pela reportagem do Estadão. "Estamos falando de formas de violência que foram naturalizadas socialmente. A violência de gênero também tem proporções epidêmicas, mas faz de tal modo parte do nosso cotidiano que ostenta números alarmantes todos os dias", observa Bueno.
Os números podem ser ainda maiores, pois nem todos os crimes cometidos contra mulheres por atuais ou ex-parceiros são registrados como feminicídio. No caso de estupro em geral e de vulnerável, a subnotificação já era tema importante na análise dos dados, mas a falta de acesso aos órgãos para realizar a denúncia durante a pandemia pode ter contribuído para uma piora no cenário.
"Em casos de violência sexual, precisa do exame de corpo de delito, então estamos falando de um registro que exige a presença da vítima", afirma Bueno. Para a diretora, se não houver mecanismos que assegurem uma mensuração adequada, o país não será capaz de preparar os serviços públicos para atender a totalidade das vítimas.
O Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2021, realizado pelo fórum e divulgado em julho, revela que os crimes sexuais apresentam altíssima subnotificação e que a falta de pesquisas periódicas de vitimização torna ainda mais difícil sua mensuração.
"Estudos que especulam as hipóteses sobre as razões de tal fato têm ganhado espaço. Fala-se em aspectos como uma construção coletiva de pactos que ocultam e silenciam esses crimes, a assim chamada cultura do estupro, somada ao compartilhamento de práticas de masculinidade violentas que perpassam essas ações", diz trecho do texto sobre os dados de violência sexual no país.
A pesquisa "Percepções da população brasileira sobre feminicídio", realizada pelo Instituto Patrícia Galvão e Locomotiva, divulgada em novembro deste ano, mostrou que, para nove em cada dez brasileiros, o local de maior risco de assassinato para as mulheres é dentro de casa, por um atual ou ex-parceiro. Ela revelou, ainda, que 57% dos brasileiros conhecem alguma mulher que foi vítima de ameaça de morte pelo atual ou pelo ex-parceiro, o que equivale a 91,2 milhões de pessoas.