A médica intensivista Patrícia Mello, primeira mulher nordestina piauiense a ser eleita presidente da Associação de Medicina Intensiva Brasileira - Amib, deu detalhes sobre sua profissão no programa Falando Nisso, da Rede Meio Norte,apresentado por Maia Veloso, nesta segunda-feira (25).
Encarregado de realizar cuidados intensivos e liderar a equipe na UTI, cuidando de pacientes em estado crítico e atuando como intermediário entre especialistas, assistentes e familiares, o médico intensivista é extremamente importante para a população. Para a Dra. Patrícia, essa especialidade oferece uma oportunidade profissional única.
“É uma especialidade absolutamente apaixonante. Na minha visão, é uma excelente especialidade para a mulher. Ela tem como organizar seus horários, sua vida, às vezes até de uma forma mais racional do que muitas outras especialidades. Mas tem também o lado difícil, porque é uma vivência de arte intensa. Então o segredo é realmente identificar aquilo que te envolve”, afirmou.
“Como todas as áreas tem a dor e a delícia”, explica a presidente da Amib. Segundo ela, muitos podem hesitar diante da percepção de que é uma área difícil e densa, associada apenas a plantões exaustivos. No entanto, ela destaca que mesmo durante os plantões, é possível dosar a intensidade e encontrar satisfação na prática.
DESAFIOS
Questionada sobre o desafio de presidir a Associação de Medicina Intensiva Brasileira, Dra. Patrícia explicou que a principal barreira é proporcionar uma qualificação profissional mais homogênea, pois ocorre um "atraso, um delito" na educação. Ela ressaltou que o seu foco, a partir de agora, é a realização de pesquisas e eventos científicos.
"O primeiro desafio é manter, promover ações que melhorem a qualificação profissional, através de eventos científicos, de cursos, de pós-graduação, e que minimize a heterogeneidade dessa formação [...] Do Brasil, você pode não ter acesso a uma série de tecnologias, fica um atraso. Então, essa é uma das missões mais importantes para os próximos dois anos, é gerar projetos, programas, fazer desses jovens médicos melhores. Gerar cursos, projetos, intercâmbios, consórcios", explica.
Através do conhecimento e da tecnologia, os jovens médicos podem atuar direto na profissão, contando que "todos precisam ser adequadamente treinados". Apesar de assumir um cargo tão honroso, a Dra.Patrícia Mello não esquece seus princípios: "eu me realizo muito na docência com os alunos e também na luta com a formação que geram qualidade e segurança".
"A pandemia trouxe esse reconhecimento. Hoje as pessoas compreendem que não é qualquer médico que deve atuar, e sim profissionais qualificados [...] Então, eu me caracterizo por essa busca, pela formação de excelência, e isso me move", enfatiza.
GESTÃO DE LEITOS DURANTE A PANDEMIA
Durante os momentos mais críticos da pandemia, profissionais de saúde foram confrontados com a urgência de "abrir leito" em meio a uma busca desesperada por recursos vitais. Ela trás reflexões sobre a intubação e o uso de ventiladores, com a crença disseminada de que quem recorresse a esses equipamentos enfrentaria um desfecho terrível.
A Dra. Patrícia, compartilhando suas experiências, contou que um de seus pacientes expressou seu receio ao afirmar: "Eu não quero falar no ventilador de jeito nenhum, porque quem vai para o ventilador morreu". No entanto, a especialista destaca a importância de entender que abrir leitos e recorrer a ventiladores, seria apenas uma parcela da solução.
“Veja bem, o ventilador, imagine como se fosse um carro potente. Se você pegar um carro potente e der nas mãos de um menino de 5 anos para dirigir, vai ter acidente. Então o que salvaria a vida das pessoas não era o leito, não era o ventilador, não era o baú. Falam de oxigênio, deve ter quem sabia comandar aquilo ali”, ressaltou.
DESIGUALDADE DE LEITOS
Apesar de avanços notáveis, a questão dos leitos de UTI no Brasil ainda enfrenta obstáculos significativos. De acordo com a doutora, o país já dispõe de 45 mil leitos de UTI. Contudo, a crise se revela na distribuição desigual desses recursos cruciais.
“Então, não faltam leitos. No entanto, quando a gente observa a distribuição, você começa a identificar o problema. Ou seja, desses 45 mil leitos, aproximadamente 50% são do SUS. Os outros 50% são da rede suplementar, rede privada. 75% da população é SUS e 25% é que vai usar a saúde suplementar. Por aí, a gente já começa a ter uma desproporção”, explica.
No entanto, a doutora esclarece que “mesmo os 25 mil seriam suficientes como leitos de SUS’’, porém a maioria da porcentagem dos leitos está concentrada nas regiões Sudeste e Sul do país, deixando as regiões Nordeste e Norte desfavorecidas e enfrentando uma carência crítica de alas de UTI.
QUAL SERIA A SOLUÇÃO?
Patrícia Mello enfatiza que estabelecer centros de saúde especializados não é uma tarefa simples e requer cuidadosa consideração das condições necessárias. O desafio vai além de criar tais instalações, exigindo uma infraestrutura e uma equipe altamente especializadas. Diante desse cenário, a solução proposta para uma gestão pública eficaz envolve a cuidadosa seleção de centros de referência capazes de lidar com casos de alta complexidade.
“É preciso que haja toda uma condição para realizar isso. Você tem que ter corte de sangue, diálise, centro cirúrgico, tomografia, outros especialistas, neurologistas, hemodinamicistas e cirurgiões. Não é só cirurgia, não é só um parâmetro, são profissionais. [...] é ter outros microcentros de média e outros de baixa complexidade com o sistema de drenagem”, finaliza.