A Polícia Federal (PF) está preparando uma solicitação para o indiciamento de integrantes do governo Bolsonaro, acusados de violação da soberania nacional no âmbito de um inquérito sobre supostas irregularidades na Agência Brasileira de Inteligência (Abin). Essa transgressão é enquadrada na Lei nº 14.197, promulgada pelo então presidente Bolsonaro em 2021, a qual tipifica como crime ações que atentem contra o Estado Democrático de Direito. As informações foram divulgadas pela coluna de Paulo Capelli, no portal Metrópoles.
De acordo com fontes próximas à investigação, a alegada infração teria sido perpetrada por meio da utilização do software de espionagem First Mile. Adquirido pela Abin por R$ 5,7 milhões durante a administração do governo Temer, este sistema de origem israelense teria sido empregado para monitorar a localização de autoridades, opositores e aliados de Bolsonaro durante o mandato anterior.
Os investigadores destacam o artigo 359, que trata de espionagem. Ele considera crime "entregar a governo estrangeiro, seus agentes, ou a organização criminosa estrangeira, documento ou informação classificados como secretos ou ultrassecretos", em desacordo com a lei ou regulamento. O inciso 2 também considera crime se "documento, dado ou informação for transmitido, ou revelado com violação do dever de sigilo". A pena prevista é de 6 a 15 anos de prisão.
O First Mile armazenava dados em um servidor localizado em Israel, onde está sediada a Cognyte, empresa responsável pelo desenvolvimento do software. A empresa tinha acesso aos números de telefone registrados no sistema.
Autoridades da Polícia Federal sustentam a crença de que ao empregar o software israelense para monitorar autoridades brasileiras, o governo Bolsonaro colocou em risco informações sensíveis à soberania nacional, expondo-as a países estrangeiros.
O First Mile possibilitava a obtenção da localização aproximada de pessoas que utilizavam dispositivos móveis com tecnologias 2G, 3G e 4G, o que facilitava o rastreamento de encontros pessoais ou itinerários das pessoas monitoradas pela Abin. O dispositivo não realizava interceptação telefônica ou telemática, ou seja, não tinha acesso às conversas ou mensagens trocadas pelos alvos.
Além da questão do uso inadequado do First Mile, a Polícia Federal está investigando outras possíveis irregularidades na Abin, como a suspeita de infiltração de agentes em campanhas eleitorais de 2022 e o suposto uso da estrutura da agência para proteger o senador Flávio Bolsonaro no caso das rachadinhas.
A Polícia Federal está em busca de detalhar a conduta individual de cada envolvido nos casos sob investigação. Todos os acusados negam ter cometido irregularidades na Abin e já foram alvo de mandados de busca e apreensão autorizados pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF).