O ministro do Supremo Tribunal Federal Ricardo Lewandowski deferiu um pedido da defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e autorizou o compartilhamento de mensagens vazadas do celular do ex-procurador da República Deltan Dallagnol com a ação em que o petista pede indenização no caso do PowerPoint, que tramita no Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Em março, a 4ª Turma do STJ condenou o ex-procurador a indenizar Lula em 75.000 reais por causa da apresentação em que ele atribuiu ao ex-presidente a chefia do esquema de corrupção que atingiu a Petrobras.
As mensagens em questão, trocadas no aplicativo Telegram, foram hackeadas do celular de Deltan e apreendidas pela Polícia Federal na Operação Spoofing, em 2019. Lewandowski autorizou acesso ao conteúdo pelos advogados de Lula.
Nos diálogos que a defesa do petista pediu para remeter ao STJ, datados de 2017, Deltan discute com interlocutores a criação de um fundo, irrigado com dinheiro de suas palestras, para arcar com eventuais ações de indenização na Justiça. O assunto começou a ser debatido pelo ex-procurador da Lava-Jato nos meses seguintes ao protocolo da ação de indenização pela defesa de Lula, em dezembro de 2016. Nos chats, o então procurador demonstra cuidado para manter em segredo a real motivação do fundo, diz temer que ele fosse interpretado como “confissão de culpa” e cita diretamente a ação movida pelo ex-presidente.
Diante da criação do fundo, como mostrou o Radar, os advogados do ex-presidente apontam possível “estelionato” de Deltan Dallagnol ao ter aberto uma vaquinha virtual para arrecadação de recursos que paguem a indenização determinada pelo STJ. As doações por meio de Pix ao ex-procurador chegaram a 575.000 reais. Deltan, que vai disputar a eleição a deputado federal no Paraná pelo Podemos, nega qualquer irregularidade.
As mensagens de Deltan Dallagnol
Nas conversas, Deltan Dallagnol afirma que a criação do fundo envolvia motivações que ele preferia manter ocultas. “Cá entre nós (não conte nem pra sombra rs), o fundo é um meio de nos protegermos contra as ações de indenização que vieram/virão”, disse em diálogo com uma interlocutora, em junho de 2017. No mesmo chat, ele se mostra preocupado que a criação do fundo para custeio de indenizações judiciais pudesse ser interpretada como “confissão de culpa”. “A questão é a do fundo. Como manter intacto por mais de dez anos sem reconhecer que é pra ação e, com isso, ser uma espécie de confissão de culpa?”, indagou.
Em outras mensagens, Deltan Dallagnol atribui a criação do fundo especificamente à ação por danos morais movida por Lula em relação ao PowerPoint. “A questão é: todas as finalidades que não quero declarar expressamente (custeio da ação do Lula contra mim e eventual plano de futuro em off) estão abrangidos no texto, a seu ver?”, indagou a outro interlocutor, em janeiro de 2017. “Imagina eu ser condenado na ação do Lula a 1,5 milhão… não dá pra confiar que daqui a 15 anos o povo vai fazer um crowdfunding”, afirmou em outra conversa, em junho de 2017.
Ao se referir à criação do fundo, em publicação em sua conta no Facebook datada de 17 de junho de 2017, Deltan Dallagnol citou as motivações para tanto, mas não mencionou eventuais indenizações a que membros da Lava-Jato fossem condenados a pagar. “Os valores estão sendo destinados a um fundo que será empregado em despesas ou custos decorrentes da atuação de servidores públicos em operações de combate à corrupção, tal como a Operação Lava-Jato, para o custeio de iniciativas contra a corrupção e a impunidade, ou ainda para iniciativas que objetivam promover, em geral, a cidadania e a ética”, escreveu.
Em uma das trocas de mensagens em janeiro de 2017, que a defesa de Lula diz ter como interlocutores Deltan Dallagnol e Roberto Leonel, ex-auditor da Receita Federal, o ex-procurador se mostra interessado em saber sobre quais tributos incidiriam sobre valores recebidos por palestras. Neste caso, ele também cita diretamente Lula e o fato de que, até aquele momento, os valores que arrecadava nas palestras eram destinados à construção do hospital oncopediátrico Erasto Gaertner, em Curitiba.
“Roberto, depois de ter sido acionado pelo Lula, estou pensando em fazer um fundo de reserva a partir das palestras (o valor estava sendo doado diretamente pelas empresas para o Erasto Gaertner). Contudo, fazendo o fundo, ainda que me comprometa a doar o valor se não o usar, preciso recolher tributos como se fosse ficar comigo. Vc sabe me dizer que tributos incidem sobre palestras ou como descubro isso de modo seguro? Desculpe te incomodar com essa pergunta, mas confio muito no seu conhecimento e não podemos errar hoje. Peço para manter essa questão de modo reservado”, afirmou.
Por: Veja