A 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal rejeitou o recurso apresentado pelo vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos) contra uma determinação do ministro Gilmar Mendes. Em fevereiro, o decano da Corte anulou uma decisão do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ) que havia rejeitado uma queixa-crime movida pelo Partido Socialismo e Liberdade (Psol) contra o vereador, alegando difamação. A negação do recurso ocorreu durante uma sessão virtual, encerrada neste sábado (27).
Em primeira instância, uma ação foi movida contra o político devido a uma publicação feita por ele no Twitter. Na publicação, ele fazia uma associação entre o partido e o ex-deputado federal Jean Wyllys com o atentado a faca contra o então candidato à Presidência Jair Bolsonaro, ocorrido em setembro de 2018. O Partido Socialismo e Liberdade (Psol) recorreu ao STF por meio de um recurso extraordinário, alegando que tanto na sentença penal condenatória quanto no julgamento da apelação, não foi considerado todo o conteúdo da postagem nas redes sociais, que resultou na acusação de difamação.
Em fevereiro, ao decidir a favor do recurso, Mendes considerou importante analisar a linha do tempo dos eventos relacionados ao caso para uma melhor compreensão da demanda. O ministro destacou que a decisão da 2ª Turma Recursal Criminal do Conselho Recursal dos Juizados Cíveis e Criminais do TJ-RJ foi baseada apenas em um recorte do conteúdo publicado. Os retweets feitos pelo vereador, compartilhando conteúdos produzidos por outros usuários da rede social, não foram devidamente considerados na decisão.
"De fato, da forma como foi analisado o conteúdo da mensagem pelo Tribunal de origem, subentende-se que o agravante, Carlos Nantes Bolsonaro, postou apenas uma frase solta, sem correspondência com nenhum fato certo e determinado e sem análise de qualquer conteúdo histórico. Entretanto, essa análise não se mostra fidedigna, pois, quando todo o conteúdo é lido em conjunto, fica claro que o agravante tenta relacionar o atentado cometido por Adélio Bispo a Jean Wyllys, ex-deputado do Psol, e ao partido político, com base em acusação certa e determinada, materializada pela acusação de notícia falsa."
Gilmar Mendes concluiu que a manifestação de Carlos Bolsonaro não se limitou a uma mera crítica, podendo caracterizar um crime de difamação. Diante disso, o parlamentar apresentou um agravo regimental contra a decisão do ministro. A defesa de Carlos Bolsonaro argumentou, entre outros pontos, que não houve omissão no julgamento em instância inferior. Além disso, afirmou que a decisão de Gilmar adentrou no mérito do caso, reexaminando fatos e provas. A defesa também ressaltou que Carlos Bolsonaro só poderia ser responsabilizado pelo conteúdo produzido por ele próprio e que não existiria justa causa, já que as condutas alegadas não se enquadrariam no crime de difamação. Além disso, alegou que afirmações genéricas feitas em redes sociais não seriam suficientes para fundamentar uma ação penal.
No plenário virtual, Gilmar, como relator do caso, apresentou voto reforçando a decisão monocrática tomada em fevereiro. O ministro destacou que o caso "põe em perspectiva a relevante — e atual — discussão sobre os limites da liberdade de expressão no direito brasileiro, especialmente em relação a discursos manifestamente difamatórios".
"Intentar que a responsabilidade por divulgação de notícias potencialmente lesivas se restrinja apenas a quem cria a notícia, e não a quem a propaga por meio da internet, instrumento que tem o condão de atingir um grande alcance de público, seria incorrer no esvaziamento do combate à desinformação, preocupação atual e transnacional", diz o ministro.
Segundo Gilmar, a liberdade de expressão, embora seja um direito fundamental que guarda especial proteção da ordem constitucional, "não pode ser vista como absoluta, uma vez que a propagação de notícias com potencial lesivo é suscetível à tutela jurisdicional, podendo gerar responsabilidade na esfera individual e coletiva, civil e criminal".
O ministro Kassio Nunes Marques apresentou uma divergência em relação à decisão. Ele ressaltou que o acórdão do julgamento no TJ-RJ concluiu que a postagem em questão não configurava o crime de difamação, uma vez que não continha um fato específico e determinado, delimitado no tempo e no espaço, conforme jurisprudência consolidada.
De acordo com o ministro piauiense, o julgamento indicou que as acusações feitas contra Carlos Bolsonaro eram vagas, imprecisas ou indefinidas, e não possuíam a capacidade de caracterizar o crime de difamação. Ele ressaltou que, mesmo que os fatos fossem ofensivos ou graves, não seria configurado o crime de difamação, a menos que fosse descrito um fato específico e determinado. Nunes destacou que, em algumas situações, poderia ser caracterizado o crime de injúria.
Assim votou Nunes Marques: "Firmada a conclusão nas instâncias ordinárias de que, na postagem supostamente difamatória, não há qualquer fato certo e determinado atribuído à parte ora recorrida, para se chegar a conclusão distinta daquela adotada pelo acórdão recorrido seria indispensável o reexame do suporte fático-probatório dos autos — com a realização de nova contextualização da postagem em conjunto com outras mensagens também postadas pelo recorrente — providência vedada em sede de recurso extraordinário, conforme orientação sedimentada na Súmula 279/STF".